Um hino a Nossa Senhora

A Catedral de Notre-Dame é tão bela que se pode olhá-la indefinidamente, cheio de enlevo, de veneração e de ternura. Quem a aprecia muito passa a amar a ordem sublime das coisas, que conduz ao amor de Deus.

 

Notre-Dame de Paris. Eis a catedral de uma beleza perfeita, alegria da Terra inteira!

Para sentir o equilíbrio da fachada, notemos que há três partes distintas. Uma vai dos portais de entrada e termina com a galeria enorme de estátuas, as quais dão as costas para um terraço que vou analisar daqui a pouco.

Um resplendor em torno da Santíssima Virgem

Percebe-se ali o corrimão do terraço e se vê, logo atrás, uma imagem de Nossa Senhora sustentando nos braços o Menino Jesus. É a segunda parte do edifício, que vai do terraço até uma série de colunas que separa o terraço da torre. Há uma grande rosácea central, toda feita de vitrais. Nela nota-se uma parte mais central, delimitada por um trabalho de pedra. Dentro há um círculo menor ainda, onde está a cabeça de Nossa Senhora. A ideia que fica insinuada é a seguinte: toda essa rosácea é o resplendor da cabeça de Maria Santíssima. E sendo a rosácea o centro da catedral, a ideia que fica meio confusa, mas realmente verdadeira, é que a catedral é um hino a Nossa Senhora.

Contrastes harmônicos na relação entre os diversos elementos da fachada

Ela tem nos braços o Menino Jesus e, com o mais inefável sorriso de Rainha e de Mãe, olha para seu Divino Filho. A alma fica assim transportada de entusiasmo e com vontade de subir. O que ela encontra em cima? Uma série de colunas, mas que dão para o vazio!

Essas colunas têm uma função que parece um disparate: sendo tão frágeis, elegantes e harmoniosas, parecendo irmãs que se tocam pelas mãos, elas sustentam o peso de duas torres. Porém, ninguém tem a impressão de que as torres vão esmagar a colunata. Parece tão natural, com um contraste tão agradável, que se uma pessoa mais atenta não nos mostrasse, talvez nem notaríamos.

Por detrás, vemos a flecha que se ergue, bem no meio das duas torres. O resto é o céu…

É certo que não foi terminada a construção das torres, as quais teriam uma parte mais alta. Ninguém pode imaginar como seria, nem ousa completar uma coisa que, quando se olha, tem-se a impressão de não pedir complemento. Onde está o talento para completar uma obra admirável como essa? Não foram encontradas as plantas que os arquitetos deviam seguir, ninguém ousou mexer nisso.

Considerem como a relação desses vários elementos dá uma impressão de harmonia. Qual? Embaixo, três portais; o do centro é um pouco maior do que os outros dois. Mas não se percebe bem, pois é discretíssima a diferença. Contudo, se os portais fossem da mesma altura, seriam sem graça.

A ogiva é a nota do andar térreo. O andar de cima começa com a galeria de estátuas e acaba com a colunata. No meio há uma rosácea e duas ogivas, uma de cada lado. Cada ogiva é dividida em duas. E, no ponto em que as duas se encontram, há outra rosácea.

Assim, o redondo é a nota mais saliente nesse andar, contrastando com o pontiagudo de tantas outras partes. Mas observem a harmonia, o bom senso e o equilíbrio de coisas tão diversas e tão bem reunidas. Notem como fica leve, quase como um brinquedinho, a estátua colossal de Nossa Senhora ladeada por duas figuras de Anjos.

Por cima, vê-se a massa enorme das torres, cada uma com duas notáveis ogivas, onde os sinos tocam gravemente nas grandes horas do ano litúrgico e, às vezes, nas grandes horas da História da França, que são as grandes horas da História do mundo.

A galeria dos reis

Essa galeria com estátuas de reis tem sua história. A Revolução Francesa, sempre ela mesma, decapitou todas essas esculturas porque, como os bandidos tinham guilhotinado o rei e a rainha, quiseram “guilhotinar” também todos esses reis do Antigo Testamento.

Recentemente, nos alicerces de um banco próximo a Notre-Dame, quiseram fazer construções e encontraram essas cabeças, que a Revolução Francesa tinha arrancado, enterradas no subsolo do banco. Fizeram-se estudos e verificou-se que foi um homem piedoso, residente nas cercanias, que enterrou essas cabeças ali, porque ele não se conformava com essa decapitação.

Veio o dia em que mãos justiceiras tiraram do subsolo todas essas cabeças e tentaram colocar nos troncos dos reis. Mas, infelizmente, as autoridades decretaram que não ficavam bem, não havia meio de prendê-las. Entretanto, eram belas obras de escultura e foram levadas para o Museu de Cluny, que é o museu de coisas da Idade Média.

Contemplação que conduz ao amor de Deus

Todas essas coisas tão diversas se unem de um modo tão tranquilo, mas tão interessante, que se fica olhando indefinidamente, cheio de enlevo, de veneração e de ternura. Porém, se colocarmos diante desse monumento um frenético, um indivíduo que baila essas danças modernas, nasce uma batalha, porque ou ele, à força de gostar do monumento, perde o frenesi, ou recusa a santa influência do monumento e o abandona. Entretanto, para almas predispostas a aceitar essa tranquilidade, essa estabilidade, a catedral quer dizer enormemente! Quem começa a gostar daquilo, por novato que seja, passa a amar a ordem sublime das coisas que conduz ao amor de Deus.    v

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 28/6/1986)