Lindo exemplo para os governantes eclesiásticos
O Rei Santo Edmundo foi martirizado porque não aceitou fazer negociações de paz com os pagãos, pois isto significava a apostasia de seus súditos. Seu sangue fez com que toda a Inglaterra se cristianizasse e, até a época do protestantismo, ela foi uma nação católica que durante algum tempo se chamou Ilha dos Santos.
Comentaremos uma síntese biográfica sobre Santo Edmundo, extraída do livro Os Santos Militares, do General Silveira de Mello. (Não dispomos dos dados bibliográficos desta obra.)
Enfrentando o inimigo por excelência
Edmundo, que fora muito bem educado na Religião Católica, tornou-se modelo de cristão para seu povo. Justo e bom, era homem de invulgar energia. Percebeu cedo o perigo que representavam os escandinavos para seu país e preparou-se militarmente, assim como dispôs seu povo para uma possível guerra.
Os escandinavos eram, naquele tempo, o grande perigo dos povos civilizados. Hoje tão pacíficos, entretanto foram no passado os tiranos dos mares. Eles ocupavam a Escandinávia e deitavam aquelas migrações pelos mares, que iam descendo pelos vários lugares da Europa e que representavam, digamos, a última leva das invasões bárbaras no continente europeu. Para se ter uma certa ideia de qual era o espírito deles, alguns usavam o título de reis do mar, porque eram monarcas de povos que viviam em barcos – juntamente com as mulheres, os filhos e tudo o mais – fazendo pirataria de um lado e de outro. Aliás, eram barcos com umas proas lindas, de uma audácia e arrogância de que a Suécia e Dinamarca perderam completamente o segredo. Com a queda das proas caiu tudo. Fala-se de figuras de proa; poder-se-ia dizer que cada povo tem a proa que merece. De maneira que preparar o seu povo contra a invasão desses inimigos significava enfrentar o inimigo por excelência.
Não se enganou em suas previsões. De fato, os dinamarqueses atacaram o reino inglês. No primeiro combate foram duramente rechaçados, mas, unindo esforços num grande número, venceram a Santo Edmundo e o aprisionaram em Hoxne. Ele venceu uma primeira leva de inimigos que atacou o seu reino. Mas eles concentraram-se e naturalmente o esmagaram, pelo grande número que tinham desembarcado em vários pontos da Inglaterra.
Nexo entre os assuntos políticos e os religiosos
O chefe dos adversários fez várias propostas de paz ao santo rei, que as recusou por serem contra a Religião Católica e os direitos de seus súditos. Foi duramente supliciado e, por fim, decapitado.
Foi martirizado a 20 de novembro de 870. Um Concílio nacional reunido em Oxford, em 1122, tornou obrigatória a festa do mártir. Suas relíquias, inclusive um saltério que usava diariamente, foram veneradas na Abadia de Cluny até o surto da heresia protestante. Preso e levado para Hoxne, Santo Edmundo foi intimado a fazer negociações de paz pelas quais ele cedia seu reino aos vencedores. Ora, ele não queria fazer isso porque seria entregar seu povo aos pagãos e favorecer o restabelecimento da religião pagã naquele local. Ele resistiu e, então, foi morto. Vemos a alta consciência que tinha esse homem do papel de rei, de suas obrigações e das relações entre os assuntos políticos e os religiosos.
Ele tinha noção de que a queda dele e a implantação de uma dinastia de reis pagãos traria a paganização do Estado e dos indivíduos. Causaria, portanto, a apostasia daqueles povos, a perdição das almas. Ele compreendia muito bem o nexo entre a vida política, a forma do Estado e a forma religiosa, e por isso se manteve fiel até o fim, sendo martirizado. Por que razão queriam que ele renunciasse? Naturalmente porque Santo Edmundo continuava a ter prestígio, senão a sua renúncia não adiantava de nada. É porque era difícil consolidar a conquista, enquanto não houvesse uma prova de que ele tinha renunciado. Talvez os inimigos quisessem até levá-lo a seu próprio reino para declarar aos seus súditos que ele tinha renunciado. Santo Edmundo entendeu isso e não quis renunciar, provavelmente na esperança de que seus súditos organizassem uma espécie de revolução, de guerrilha contra o ocupante para salvar a Fé. E ele regou com seu sangue essa esperança de uma restauração católica.
Devemos ser fiéis até a morte à nossa vocação
Que lindo exemplo para os governantes eclesiásticos! Sem dúvida, o sangue desse rei valeu porque, de fato, a Inglaterra acabou se cristianizando inteira e, até a época do protestantismo, ela foi uma nação católica que durante algum tempo se chamou Ilha dos Santos, tal foi o número de bem-aventurados que nesse país floresceram. Devemos pedir a Nossa Senhora que nos dê muitos homens de Estado e muitos homens de Igreja que tenham esse espírito. Porque enquanto os povos católicos, no campo temporal e, sobretudo, no espiritual, não são governados por homens dispostos a derramar seu sangue pela Santa Igreja, eles não são dirigidos por quem preste. Só governa bem quem está disposto a levar a fidelidade a seus princípios e a seu cargo até o martírio; do contrário não vale de nada. Assim como um militar que não está disposto a morrer é igual a zero, um bispo, um príncipe, um rei, um alto governante que não esteja decidido a morrer para o cumprimento de seu dever é igual a absolutamente zero. Os altos cargos exigem a alta coragem. São os cargos pequenos que podem se acomodar com o valor moral normal. Os grandes cargos requerem o grande espírito de dedicação, o grande sacrifício. Entretanto, será um cargo o que Deus concede de mais alto a um homem? O que vale mais: um cargo ou uma vocação? Não há situações em que uma vocação vale mais do que um cargo? Nós temos mais do que um alto cargo, possuímos uma alta vocação. Pensemos no exemplo desse rei para termos sempre a deliberação de sermos fiéis até a morte à nossa vocação.
Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 20/11/1970)